Freguesia era o nome dado, até a Proclamação da Republica, a uma instituição eclesiástica ou civil, com aspecto semelhante a de um distrito hoje, com representantes administrativos subordinados a vila a qual pertenciam, os quais eram eleitos pelos moradores da freguesia, além de um representante da igreja (quase sempre o vigário nomeado).
O Padroado Régio
A criação de uma paróquia, conhecida também como freguesia canônica, no período do Brasil Colônia e Império, era prerrogativa do Rei, ou do Imperador, por força de bulas pontifícias que lhes davam extensos poderes, equivalentes aos dos Bispos Diocesanos, na organização eclesiástica. Esse poder se estendia sobre as dioceses e as paróquias, cabendo ao poder real em contrapartida a obrigação de mantê-las e de auxiliar a propagação da fé nas terras que lhe pertenciam. É o que era denominado de regime de padroado régio.
Pelo regime de padroado, cabia aos Bispos apenas a aprovação e execução das decisões do poder real a respeito da criação, divisão ou extinção de uma paróquia, além da nomeação do administrador paroquial: o vigário. Posteriormente a criação da paróquia, esta ficava subordinada ao bispado diocesano à qual pertencia.
O padroado era exercido através das deliberações da Mesa da Consciência e Ordens, um tribunal composto por desembargadores, deputados e conselheiros imperiais, tribunal este que submetia suas decisões à chancela final do poder real.
O processo de criação da freguesia canônica
A criação de uma paróquia era um processo evolutivo, que tinha uma série de exigências a serem cumpridas, antes da elevação da localidade a freguesia canônica.
O ponto de partida era a doação de um patrimônio, o qual os moradores da localidade deveriam ter condições financeiras de arcar com os custos. Posteriormente, a expedição de um alvará régio era necessário para construção de uma ermida ou capela, também por conta dos moradores da localidade.
Após a doação do patrimônio e da construção da capela, esta era reconhecida como capela filiada a freguesia a qual pertencia. Esse reconhecimento era dado por carta régia, liberando a capela filiada para receber somente missas eventuais (casamentos, batizados e encomendações de almas não eram permitidos, a não ser por autorização do Bispo), executadas por um sacerdote itinerante designado, o qual cuidava também dos trâmites administrativos relativos aos frequentadores da capela.
Era comum também a construção de capelas em terrenos particulares, as quais eram dedicadas apenas ao culto do seu padroeiro, não sendo permitida nestas a realização de sacramentos ou encomenda de almas. Às vezes, com autorização expressa do Bispo Diocesano, realizavam-se nessas capelas particulares casamentos e batizados.
Os pedidos para criação da paróquia de Sta Rita.
Neste contexto político-administrativo, por volta de 1820, a região denominada Ribeirão do Vintém, na aplicação da capela de Santa Catarina (Natércia), já era quase toda habitada. Composta por grandes fazendas e por pequenos sítios, os moradores do local necessitavam se deslocar até a capela de Santa Catarina, com muita dificuldade, para frequentar os serviços religiosos. Segundo relato de texto da época, escrito por viajantes da região, o acesso do Vale do Sapucaí até Santa Catarina era através de “dificultosos caminhos, serras e ribeiros (…) dentre morros e tesos ásperos não aprazíveis.”.
Neste período, alguns homens de posses e prestigio político da região do Ribeirão do Vintém, se organizaram para solicitar ao Imperador, via Mesa, e ao Bispo Diocesano, a construção de uma capela na localidade, com o propósito de lhes prover o “pasto espiritual” com maior facilidade.
O primeiro passo, a doação de um patrimônio, se concretizou em 2 de maio de 1821, com a doação de +ou- 8 alqueires de terras para o patrimônio da futura capela. Manoel da Fonseca e Genoveva Martins eram moradores da margem esquerda do Sapucaí, mas possuíam terras do lado direito também, parte destas doadas para o patrimônio de Santa Rita. Segundo estudos do saudoso amigo historiador Adirson Ribeiro, o casal foi persuadido por três importantes fazendeiros da região – Alf Braz Fernandes Ribas, Cap. Manoel Joaquim Pereira e Alf. José Vieira da Fonseca – há abrirem mão de tal patrimônio em prol de um bem maior.
As terras eram claramente de baixa produtividade, compostas por um outeiro – vertente de uma colina maior que não fazia parte do patrimônio – cercado por uma planície de terreno brejoso e vargens alagadiças pelas grandes enchentes do Sapucaí, cortadas pelo córrego do Mosquito.
O patrimônio era a garantia de existência da capela, pois era através de pagamentos de foros, da negociação de suas terras, além de doações, que se arrecadava fundos para ergue-la e melhorá-la. A tarefa de administrar esse patrimônio ficou a cargo dos procuradores nomeados na carta de doação das terras. Dentre eles foi nomeado um tesoureiro que cuidava dos fundos arrecadados para as obras da capela e suas alfaias.
Para o segundo passo, obter a autorização para construção da capela, o trabalho era mais árduo, pois se exigia destes moradores muito empenho político em duas frentes: a Imperial e a Diocesana.
Para que tal empreitada rendessem os frutos desejados, o mais comum era o envio de cartas, as chamadas súplicas, dirigidas ao Imperador e a Mesa. Visitas a Corte, aos conselheiros da Mesa e a sede do bispado também não eram descartadas. Muita conversa fazia-se necessária para conseguir a expedição de um alvará régio e uma posterior aprovação do Bispo, as quais autorizavam a construção da capela.
Visita Pastoral de Dom Frei José
No ano de 1824, D. Frei José da Santíssima Trindade, Bispo de Mariana, passou em visita pastoral em todas as freguesias e capelas da região. Uma de suas paradas foi na freguesia de Santa Catarina, criada em 1922. Ali permaneceu por 5 dias e, certamente, recebeu a visita dos moradores do Ribeirão do Vintém, os quais suplicaram-lhe, mais uma vez, seu apoio. Prova disto é o testemunho do próprio Bispo em relato de viagem a região: “Os moradores da região novamente me solicitam a criação de outra ermida para o lugar denominado Vintém e já foi informado.”.
No mesmo ano, D. Frei José, por entender as necessidades espirituais dos moradores da região, presenteou dois fazendeiros que certamente haviam lhe suplicado pela construção da capela, com uma pia batismal a cada um. As pias foram instaladas nas capelas particulares da fazenda Água Limpa do Vintém, do Alf. Braz Fernandes Ribas, e em uma das sedes da fazenda São José, a do Cap. Joaquim Ribeiro de Carvalho. Juntamente com as pias, foi expedida também uma autorização para celebrar casamentos e batizados nestas capelas.
Um parecer sobre a construção da capela
No início de 1825, os moradores do Vintém suplicaram, mais uma vez, licença para levantar uma capela com a invocação de Santa Rita.
Segundo o Bispo de Mariana, nada mais justo, porque, em toda a nova freguesia de Santa Catarina “não havia mais do que a matriz, com quatro ou cinco mil almas derramadas por dez léguas de comprimento e quase oito de largura, com caminhos montanhosos e pouca planície”. E assim também entendeu a Mesa e o Imperador, expedindo nesse mesmo ano o alvará régio para construção da capela filiada de Santa Rita.
Dentre os nomes que certamente trabalharam duro para liberação da autorização para construção de nossa primeira capela, podemos citar os procuradores das terras doadas pelo casal Manoel e Genoveva: Alf. Antonio Manoel da Palma, o Cap. Manoel Joaquim Pereira, o Alf. Braz Fernandes Ribas, o Alf. João Pereira Lima, o Alf. José Vieira da Fonseca e o Ten. José Joaquim Ribeiro. A esses nomes podemos juntar também o nome do Cap. Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Fontes:
– Fundo Mesa da Consciência e Ordem, cód. 26, vol. 11, fls. 179v a 181v, Arquivo Nacional;
– Visitas Pastorais de Dom Frei José da Santíssima Trindade; Oliveira, Ronald Polito; Fundação João Pinheiro, 1998.